quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Não é preciso ver para crer

É de praxe cruzarmos com muitas pessoas pelas ruas, a todo momento. Basta sair de casa para sentir na pele, ou melhor, não sentir, a constância com que passamos por cidadãos. Apenas passar, atribuindo naturalidade a esse encontro de corpos num espaço não determinado previamente, traz a origem do problema de invisibilidade social.
Essa não visão do outro é problemática, uma vez que é conferida à população por meio dos padrões de consumo e situação social em que se encontram. A maioria das relações sociais é pautada pelo material, ou seja, pelo o quê e quanto se possui. Conhecemos e interagimos com alguém por meio dos mecanismos de conveniência que ambas as partes podem proporcionar.
A fim de melhor exemplificar, recorremos aos garis, borracheiros, pedreiros, faxineiras, cobradores, entre outros prestadores de serviços específicos que têm grande parcela na estrutura da civilização e garantem a pirâmide em seu “devido” lugar, como ditam as preferências burguesas (médias e altas).
Muitos são os transeuntes que não percebem a presença sutil do outro em seu lugar de trabalho, ou até de moradia, como é o caso dos mendigos.  Por não haver necessidade de se encarar, ou de conversar para resolver pendências, tornamos os inferiores economicamente menos importantes.
Nesse aspecto reside um grande erro da modernidade, pois são por esses serviços básicos e que quase sempre exigem uniformes particulares e evidentes, que a civilização possui dinamismo e caminha para eficiência nos serviços “discretos”.
Com destino traçado, atraso e correria, as pessoas passam pelos pedintes e trabalhadores e os encaram como parte da paisagem e da urbanização. Reivindicamos melhores direitos, moradias, impostos e até reclamamos desses fatores “feios” sujando as metrópoles. No entanto, poucos recorrem às instituições responsáveis a fim de alterarem essas condições. Até porque o pensamento forte dita: não me diz respeito, não me interessa.
O ser humano só é socialmente aceito se criar vínculos, se formar relações e graus de subordinação, principalmente econômica (socioeconômica). A partir daí que se montam as classes. Geralmente, quem está embaixo na escala, está tendo que trabalhar muito para se sustentar e não sobra disposição ou tempo para se preocupar com qualquer classificação.
 Infelizmente, pensa-se demais para dentro. Externamente, enxergamos apenas os apelos promocionais e de publicidade. Passa-se uma cidade de geração em geração e o comodismo é tanto dentro das camadas que só vemos quando queremos ou somos solicitados. Para crer, só é preciso existir e andar alguns quarteirões.

Há indiferença em muitos setores. Vê-se mais a função exercida pelo indivíduo (quando vê) que a sua personalidade. É como submetermos pessoa à máquina. Experimente tirar os lixeiros e as faxineiras de circulação por aproximadamente um mês e se notará a diferença, a participação marcante desses grupos considerados “menores”, mas que tanto influenciam no funcionamento da sociedade atual e preconceituosa.

empoeirado (2012)

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